Achando-se só, Álvaro sentou-se junto a uma mesa, e apoiando nela os cotovelos com a fronte entre as mãos, ficou a cismar profundamente. Isaura, porém, pressentindo pelo silêncio que reinava na sala, que já ali não havia pessoas estranhas, foi ter com ele.
Encontrándose solo, Álvaro se sentó en una mesa y apoyando los codos sobre ella con la frente entre las manos, se puso a pensar profundamente. Isaura, sin embargo, sintiendo por el silencio que reinaba en la habitación que ya no había extraños allí, se acercó a él.
— Senhor Álvaro, — disse ela chegando-se de manso e timidamente; — desculpe-me... eu venho decerto lhe aborrecer... queria talvez estar só... — Não, minha Isaura; tu nunca me aborreces; pelo contrário, és sempre bem-vinda junto de mim... — Mas vejo-o tão triste!... parece-me que aqui entrou mais gente, e alteravam-se vozes. Deram-lhe algum desgosto, meu senhor?... — Nada houve de extraordinário, Isaura; foram algumas pessoas que vieram procurar o doutor Geraldo.
-Señor Álvaro -dijo ella acercándose mansa y tímidamente-; — Disculpa... Seguro que vine a molestarte... Tal vez quería estar sola... —No, mi Isaura; nunca me aburres; al contrario, siempre eres bienvenido conmigo... —¡Pero lo veo tan triste!... Me parece que aquí ha entrado más gente, y se alzaron voces. ¿Le dieron algún problema, mi señor?... —No hubo nada extraordinario, Isaura; hubo algunas personas que vinieron a buscar al Dr. Geraldo.
— Mas então, por que está assim triste e abatido? — Não estou triste nem abatido. Estava meditando nos meios de arrancar-te do abismo da escravidão, meu anjo, e elevar-te à posição para que o céu te criou. — Ah! senhor, não se mortifique assim por amor de uma infeliz, que não merece tais extremos, É inútil lutar contra o destino irremediável que me persegue. — Não fales assim, Isaura. Tens em bem pouca conta a minha proteção e o meu amor!...
— Pero entonces, ¿por qué estás tan triste y abatido? “No estoy triste ni abatido. Meditaba sobre los medios para sacarte del abismo de la esclavitud, ángel mío, y elevarte al puesto para el que el cielo te creó. - ¡Oh! Señor, no se mortifique así por el amor de una desdichada que no merece tales extremos, es inútil luchar contra el destino irremediable que me persigue. — No hables así, Isaura. ¡Tienes poca consideración por mi protección y mi amor!...
— Não sou digna de ouvir de sua boca essa doce palavra. Empregue seu amor em outra mulher que dele seja merecedora, e esqueça-se da pobre cativa, que tornou-se indigna até de sua compaixão ocultando-lhe a sua condição, e fazendo-o passar pelo vergonhoso pesar de... — Cala-te, Isaura... até quando pretendes lembrar-te desse maldito incidente?... eu somente fui o culpado forçando-te a ir a esse baile, e tinhas razão de sobra para não revelar-me a tua desgraça. Esquece-te disso; eu te peço pelo nosso amor, Isaura.
— No soy digno de oír esa dulce palabra de tu boca. Gasta tu amor en otra mujer que lo merezca, y olvida a la pobre cautiva, que se hizo indigna incluso de tu compasión ocultándole su condición, y haciéndole pasar el vergonzoso dolor de... Tú, Isaura... ¿Hasta cuándo piensas recordar ese maldito incidente?... Yo sólo tuve la culpa de obligarte a ir a ese baile, y tenías razón más que suficiente para no revelarme tu desgracia. Olvídalo; Te pido nuestro amor, Isaura.
— Não posso esquecer-me, porque os remorsos me avivam sempre n'alma a lembrança dessa fraqueza. A desgraça é má conselheira, e nos perturba e anuvia o espirito. Eu o amava, assim como o amo ainda, e cada vez mais... perdoe-me esta declaração, que é sem dúvida uma ousadia na boca de uma escrava. — Fala, Isaura, fala sempre, que me amas. Pudesse eu ouvir de teus lábios essa palavra por toda a eternidade.
— No puedo olvidar, porque el remordimiento siempre remueve en mi alma el recuerdo de esa debilidad. La desgracia es mala consejera, y nos turba y nubla el espíritu. Lo amaba, como lo amo todavía, y cada vez más... perdóname esta afirmación, que sin duda es atrevimiento en boca de un esclavo. — Habla, Isaura, habla siempre que me amas. Si tan solo pudiera escuchar esa palabra de tus labios por toda la eternidad.
— Era um triste amor na verdade, um amor de escrava, um amor sem sorriso nem esperança. Mas a ventura de ser amada pelo senhor era uma idéia tão consoladora para mim! Amando-me o senhor me nobilitava, a meus próprios olhos, e quase me fazia esquecer a realidade de minha humilde condição. Eu tremia ao pensar que descobrindo-lhe a verdade, ia perder para sempre essa doce e única consolação que me restava na vida. Perdoe, meu senhor, perdoe à escrava infeliz, que teve a louca ousadia de amá-lo.
— Era un amor triste en verdad, un amor de esclavo, un amor sin sonrisa ni esperanza. ¡Pero la dicha de ser amado por el Señor fue una idea tan consoladora para mí! Al amarme, el Señor me ennobleció a mis propios ojos y casi me hizo olvidar la realidad de mi humilde condición. Me estremecí al pensar que, al descubrir la verdad, perdería para siempre ese dulce y único consuelo que me quedaba en la vida. Perdone, mi señor, perdone al infeliz esclavo, que tuvo la loca osadía de amarlo.
— Isaura, deixa-te de vãos escrúpulos, e dessas frases humildes, que de modo nenhum podem caber em teus lábios angélicos. Se me amas, eu também te amo, porque em tudo te julgo digna do meu amor; que mais queres tu?... Se antes de conhecer a condição em que nasceste, eu te amei subjugado por teus raros encantos, hoje que sei que a tantos atrativos reúnes o prestigio do infortúnio e do martírio, eu te adoro, eu te idolatro mais que nunca.
— Isaura, deja estos vanos escrúpulos, y esas humildes frases, que de ninguna manera pueden caber en tus angelicales labios. Si me amas, yo también te amo, porque en todo te considero digno de mi amor; ¿qué más quieres?... Si antes de conocer la condición en que naciste, te amaba subyugado por tus raros encantos, hoy que sé que a tantos atractivos unes el prestigio de la desgracia y el martirio, te adoro. , te idolatro más que nunca.
— Ama-me, e é essa idéia, que ainda mais me mortifica!... de que nos serve esse amor, se nem ao menos posso ter a fortuna de ser sua escrava, e devo sem remédio morrer entre as mãos de meu algoz.. — Nunca, Isaura! — exclamou Álvaro com exaltação: — minha fortuna, minha tranquilidade, minha vida, tudo sacrificarei para libertar-te do jugo desse vil tirano. Se a justiça da Terra não me auxilia nesta nobre e generosa empresa, a justiça do céu se fará cumprir por minhas mãos.
— ¡Él me ama, y esa idea me mortifica aún más!... de qué nos sirve ese amor, si ni siquiera puedo tener la fortuna de ser su esclava, y tengo que morir en manos de mi verdugo sin ¡remedio!.. —¡Nunca, Isaura! — exclamó Álvaro con exaltación: — mi fortuna, mi tranquilidad, mi vida, todo lo sacrificaré para librarte del yugo de ese vil tirano. Si la justicia de la Tierra no me ayuda en esta noble y generosa empresa, la justicia del cielo se cumplirá por mis manos.
— Oh! senhor Álvaro!... não vá sacrificar-se por uma pobre escrava, que não merece tais excessos. Abandone-me à minha sina fatal; já não é pouca felicidade para mim ter merecido o amor de um cavalheiro tão nobre e tão amável, como o senhor; esta lembrança me servirá de alento e consolação em minha desgraça. Não posso, porém, consentir que o senhor avilte o seu nome e a sua reputação, amando com tal extremo a uma escrava.
-¡Oh! ¡Señor Álvaro!... no se vaya sacrificando por un pobre esclavo, que no merece tales excesos. Abandóname a mi destino fatal; No es poca felicidad para mí haber merecido el amor de un caballero tan noble y bondadoso como usted; este recuerdo me servirá de aliento y de consuelo en mi desgracia. Sin embargo, no puedo permitir que degrades tu nombre y reputación amando a un esclavo hasta tales extremos.
— Por piedade, Isaura, não me martirizes mais com essa maldita palavra, que constantemente tens nos lábios. Escrava tu!... não o és, nunca o foste, e nunca o serás. Pode acaso a tirania de um homem ou da sociedade inteira transformar em um ente vil, e votar à escravidão aquela que das mãos de Deus saiu um anjo digno do respeito e adoração de todos? Não, Isaura; eu saberei erguer-te ao nobre e honroso lugar a que o céu te destinou, e conto com a proteção de um Deus justo, porque protejo um dos seus anjos.
— Por piedad, Isaura, no me tortures más con esa maldita palabra que tienes constantemente en los labios. ¡Esclavo!... no lo eres, nunca lo fuiste, y nunca lo serás. ¿Puede la tiranía de un hombre o de la sociedad en su conjunto transformar en un ente vil, y enviar a la esclavitud a quien de las manos de Dios salió un ángel digno del respeto y adoración de todos? No, Isaura; Yo sabré elevaros al lugar noble y honroso a que os ha destinado el cielo, y cuento con la protección de un Dios justo, porque protejo a uno de sus ángeles.
Álvaro, não obstante ficar sabendo, depois da noite do baile, que Isaura era uma simples escrava, nem por isso deixou de tratá-la daí em diante com o mesmo respeito, deferência e delicadeza, como a uma donzela da mais distinta jerarquia social. Procedia assim de acordo com os elevados princípios que professava, e com os nobres e delicados sentimentos do seu coração. O pudor, a inocência, o talento, a virtude e o infortúnio, eram sempre para ele coisas respeitáveis e sagradas, quer se achassem na pessoa de uma princesa, quer na de uma escrava. Sua afeição era tão casta e pura como a pessoa que dela era objeto, e nunca de leve lhe passara pelo pensamento abusar da precária e humilde posição de sua amante, para profanar-lhe a candura imaculada.
Álvaro, a pesar de saber después de la noche del baile que Isaura era una simple esclava, no por ello dejó de tratarla desde entonces con el mismo respeto, deferencia y delicadeza que a una doncella de la más alta jerarquía social. Actuó de acuerdo con los altos principios que profesaba y con los nobles y delicados sentimientos de su corazón. La modestia, la inocencia, el talento, la virtud y la desgracia fueron siempre para él cosas respetables y sagradas, ya se encontraran en la persona de una princesa o de una esclava. Su afecto era tan casto y puro como la persona que era objeto de él, y nunca se le pasó por la cabeza abusar de la precaria y humilde posición de su amada, para profanar su inmaculado candor.
Nunca de sua parte um gesto mais ousado, ou uma palavra menos casta haviam feito assomar ao rosto da cativa o rubor do pejo, e nem tampouco os lábios de Álvaro lhe haviam roçado o mais leve beijo pelas virginais e pudicas faces. Apenas depois de instantes e repetidas súplicas de Isaura, havia tomado a liberdade de tratá-la por tu, e isso mesmo quando se achavam a sós. Somente agora pela primeira vez, Álvaro, dominado pela mais suave e veemente emoção, ao proferir as últimas palavras, enlaçando o braço em torno ao colo de Isaura a cingia brandamente contra o coração.
Nunca por su parte un gesto más atrevido, ni una palabra menos casta hizo que en el rostro de la cautiva apareciera el rubor de la vergüenza, ni los labios de Álvaro habían rozado el más leve beso en sus virginales y modestas mejillas. Sólo después de unos instantes y de las repetidas súplicas de Isaura se había tomado la libertad de dirigirse a ella como tú, y eso incluso cuando estaban solos. Sólo que ahora, por primera vez, Álvaro, dominado por la más suave y vehemente emoción, al pronunciar las últimas palabras, pasando el brazo por el regazo de Isaura, la estrechó suavemente contra su corazón.
Estavam ambos enlevados na doçura deste primeiro amplexo de amor, quando o ruído de um carro, que parou à porta do jardim, e logo após um forte e estrondoso — ó de casa! — os fizeram separar-se. No mesmo momento entrava na sala o baleeiro de Álvaro, e anunciava-lhe que novas pessoas o procuravam.
Ambos estaban extasiados en la dulzura de este primer abrazo de amor, cuando el ruido de un auto, que se detuvo en la puerta del jardín, y acto seguido un fuerte y estruendoso ¡O de casa! — hizo que se separaran. En ese mismo momento entró en la sala el ballenero de Álvaro y anunció que nuevas personas lo buscaban.
— Oh, meu Deus!... que será isto hoje!... serão ainda os malditos esbirros?... — refletiu Álvaro, e depois dirigindo-se a Isaura: — É prudente que te retires, minha amiga, — disse-lhe; ninguém sabe o que será e não convém que te vejam. — Ah! que eu não sirva senão para perturbar-lhe o sossego! - murmurou Isaura retirando-se.
"¡Ay, Dios mío!... ¡cómo será esto hoy!... ¿seguirán siendo los malditos secuaces?..." reflexionó Álvaro, y luego, volviéndose hacia Isaura: "Es sabio que te vayas, mi amigo- dijo -él; nadie sabe lo que será y no es bueno que te vean. - ¡Oh! que solo sirvo para perturbar su paz! - murmuró Isaura, retirándose.
Um momento depois Álvaro viu entrar na sala um elegante e belo mancebo, trajado com todo o primor, e afetando as mais polidas e aristocráticas maneiras; mas apesar de sua beleza, tinha ele na fisionomia, como Lusbel, um não seu quê de torvo e sinistro, e um olhar sombrio, que incutia pavor e repulsão.
Un momento después Álvaro vio entrar en la habitación a un joven elegante y apuesto, vestido con la mayor perfección, y aparentando los modales más pulidos y aristocráticos; pero a pesar de su belleza, tenía en el rostro, como Lusbel, algo oscuro y siniestro, y una mirada sombría, que infundía miedo y repulsión.
— Este por certo não é um esbirro, — pensou Álvaro, e indicando uma cadeira ao recém-chegado: — Queira sentar-se, — disse-lhe, e — tenha a bondade de dizer o que pretende deste seu criado. — Desculpe-me, — respondeu-lhe o cavalheiro, passeando um olhar escrutador em roda da sala: — não é a V. Sa. que eu desejava falar, mas sim ao morador desta casa ou à sua filha.
— Este ciertamente no es un secuaz, — pensó Álvaro, y señalando una silla al recién llegado: — Por favor siéntese — dijo, y — tenga la bondad de decir lo que quiera de su sirviente. — Disculpe — contestó el señor, paseando una mirada escrutadora por la habitación: — no es usted. que quería hablar, sino al habitante de esta casa oa su hija.
Álvaro estremeceu. Estava claro que aquele mancebo, se bem que nenhuma aparência tivesse de um esbirro, andava à pista de Isaura. Todavia no intuito de verificar se era fundada a sua apreensão, antes de chamar os donos da casa quis sondar as intenções do visitante.
Álvaro se estremeció. Estaba claro que ese joven, aunque no tenía apariencia de secuaz, estaba tras la pista de Isaura. Sin embargo, para comprobar si su aprensión estaba justificada, antes de llamar a los dueños de la casa, quiso sondear las intenciones del visitante.
— Não obstante, — respondeu ele, como estou autorizado pelos donos da casa a tratar de todos os seus negócios, pode V. S.ª dirigir-se a mim, e dizer o que deles pretende.
"Sin embargo", respondió, como estoy autorizado por los dueños de la casa para manejar todos sus asuntos, puedes dirigirte a mí y decir lo que quieras de ellos.
— Sim, senhor; não ponho a menor dúvida, pois o que pretendo não é nenhum mistério. Constando-me com certeza, que aqui se acha acoutada uma escrava fugida, por nome Isaura, venho apreendê-la...
- Sí señor; No tengo la menor duda, porque lo que quiero no tiene ningún misterio. Como sé con certeza que una esclava fugitiva, llamada Isaura, está retenida aquí, vengo a aprehenderla...
— Nesse caso deve entender-se comigo, que sou o depositário dessa escrava. — Ah!.. pelo que vejo, V. Sa. é o senhor Álvaro!... — Um criado de V. Sa. — Bem; muito estimo encontrá-lo por aqui; pois saiba também que eu sou Leôncio, o legítimo senhor dessa escrava.
— En ese caso, debe entenderse conmigo, que yo soy el guardián de ese esclavo. — ¡Ah!.. por lo que veo, Su Señoría. ¡Es el señor Álvaro!... —Un criado suyo. - Bien; Estoy muy feliz de encontrarte aquí; porque sepa también que yo soy Leôncio, el legítimo amo de aquella esclava.
Leôncio.... o senhor de Isaura! Álvaro ficou como esmagado sob o peso desta fulminante e tremenda revelação. Mudo e atônito, contemplou por alguns instantes aquele homem de sombria catadura, que se lhe apresentava aos olhos, implacável e sinistro como Lúcifer, prestes a empolgar a vítima, que deseja arrastar aos infernos. Suor frio porejou-lhe pela testa, e a mais pungente angústia apertoulhe o coração.
— É ele!... é o próprio algoz!... ai, pobre Isaura!... — foi este o eco lúgubre, que remurmurou-lhe dentro d'alma enregelada pelo desalento.
Leoncio.... el señor de Isaura! Álvaro quedó como aplastado bajo el peso de esta fulminante y tremenda revelación. Mudo y atónito, contempló por unos instantes a ese hombre de rostro sombrío, que se presentaba ante sus ojos, implacable y siniestro como Lucifer, a punto de excitar a la víctima, a quien quiere arrastrar al infierno. Un sudor frío brotó de su frente y la angustia más aguda se apoderó de su corazón. — ¡Es él!... ¡Es el mismo verdugo!... ¡Ay, pobre Isaura!... —era el eco lúgubre que murmuraba dentro de su alma, congelada por el espanto.